sábado, 26 de março de 2016

SOU DOIDA? E DAI?



Acordou, ainda sonolenta, parecia que o mundo girava devagar, como seus próprios pensamentos.

Abriu os olhos, ficou observando o ambiente de seu quarto, o mesmo teto branco, procurou pela mancha escura que há anos prometia a si mesma retocar e fazê-la desaparecer, isso a incomodava. 

Virou o rosto e viu o sol ainda manso entrando em pequenos raios pelas frestas da janela sem cortina, outra providência que tomaria algum dia, colocar uma cortina, de preferência em tons de rosa claro, gostava dessa cor.

Fechou de novo os olhos, voltou a abri-los e olhou para o outro lado, uma cadeira normal, daquelas de cozinha, entulhada de roupas usadas, que precisavam ser lavadas, era essa outra providência a ser tomada; mas, hoje não, queria apenas ficar na cama mais um pouco, talvez, esse um pouco se transformasse no dia todo, e daí, não tinha nada para fazer, pelo menos, nada que a estimulasse a pular da cama ansiosa por começar a viver.

Todos os dias eram iguais, se arrastavam numa monotonia de fazer medo, não conseguia nem mesmo distinguir um dia do outro. Na realidade, até mesmo o que comia parecia ter sempre o mesmo sabor.

Abriu os olhos de novo, ali estava a mancha no teto, os raios de sol que incomodavam e a acordavam todos os dias, a cadeira com roupas sujas, e ela na cama sem vontade de levantar; mas precisava vencer a inércia, outras pessoas dependiam de sua movimentação. Se não fizesse o café da manhã era bem capaz que todos morressem de fome, depois precisava dar uma ajeitada na casa, depois viria o almoço, a tarde monótona, o jantar, a televisão ligada nos mesmos programas, a conversa insípida e maçante, e novamente uma noite sem descanso, virando de um lado a outro da cama.

Uma lágrima escorreu por seus olhos, estava cansada antes mesmo de dar um passo, estava enojada da mesmice, da rotina, da falta de esperança, o que deveria fazer? Estava morrendo em vida com as alegrias e as esperanças sendo sufocadas atrás de necessidades... suas? Não, de quem então?

Levantou, ligou o chuveiro, entrou debaixo da água de pijama, deixou a água escorrer por seu corpo febril, encharcando suas roupas, levantou o rosto e permitiu que lágrimas disfarçadas entre os jatos de água escorressem por seu rosto. Devagar, arrancou a roupa, ensaboou o corpo, lavou os cabelos, enxaguou devagar e saiu, molhando o chão, sem se importar com a bagunça. 

Colocou uma roupa confortável, penteou os cabelos, passou um baton nos lábios, olhou no espelho e falou alto:

- Sem pensar, apenas faça!

Abriu a porta, saiu para a rua, sem avisar ninguém. Trancou a porta, ganhou a rua, olhou para trás e pensou:

- Sem pressa! Apenas faça!

Caminhou, correu, riu, ouviu o som dos pássaros, cumprimentou outras pessoas que passavam por ela. Cansada, tomou o caminho de volta, não sabia quanto tempo havia passado, parou em frente a porta e pensou:

- Hoje foi um dia, o primeiro, apenas faça!

Entrou e logo de cara alguém perguntou:

- Onde você estava, custava avisar que ia sair, nem tomamos café da manhã.

- Nem eu e nem quero.

- Onde você estava?

- Onde precisava!

Entrou no seu quarto, fechou a porta, encostou nela, cerrou os olhos e pensou:

- Apenas faça!

Arrumou uma pequena mochila, pegou a bolsa, viu se ali tinha tudo que precisava, saiu do quarto, chegou à cozinha, todos estavam sentados, esperando suas providências para o café da manhã. Sorriu e disse:

- Se querem comer, façam, pois estou de saída, vou viajar e não sei quando volto!

- Vai fazer o quê?

- Descobrir onde deixei minha vida. Até mais!

Saiu para a rua, sorriu e pensou:

- Sou doida? E dai?

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