sexta-feira, 27 de maio de 2011

TERRA FERIDA

TERRA FERIDA

A tarde ia alta, o céu azul, límpido, sem nuvens, dava uma sensação boa, de que tudo estava certo.
O dia se arrastava morno como o trem que passa lento diante da estação vazia.
Olhava de um lado e de outro da estrada, às vezes, a paisagem se apresentava verdejante, pura, exalando doce perfume da natureza, outras a terra crua e vermelha refletia o sol incremente que gritava alto e assustava as aves; mas, de repente, olhei à direita, percebi que aquela imagem não se encaixava... era aberrante, a terra ferida.
Diminui a velocidade do carro e parei no acostamento. Inconformada, desci do veículo e me aproximei do corrimão, observava assustada à princípio, decepcionada depois.
Olhei à direita, era lindo, um monte protuberante, forrado de vegetação verde, aqui e acolá uma árvore colorida de rosa e outra de amarelo, alguns cavalos sonolentos pastavam. Imaginei uma casinha branquinha, pequenininha embaixo do flamboyant. Ali embaixo, na sombra fresca, eu brinco de rir e de espirrar água no pássaro que voa. Canto alto, até os grilos felizes me acompanharem. À noite vem e brejeira me convida a adormecer, uma chuva de flores e folhas faz barulho no telhado e sorrio diante da vida.
À esquerda eu olhei e vi um vale, beijado por um riacho manso, que saia de trás do monte, a relva fresca convidava a caminhar descalça, sorrindo, tirei os sapatos, que apertavam os meus pés, e, devagar, muito devagar, afundei no frescor do dia. Corri de um lado a outro, me atirei na grama, fechei os olhos e adormeci. Um sono assim de preguiça, de entardecer, livre voava nas asas do beija-flor, pousava de flor em flor. Ah! Liberdade com o rosto em chamas pelo calor do sol, refrescado pela umidade simples da brisa.
Ah! Ao centro. Que dor!
A terra ferida exclamava confusa: O que foi feito de mim?
Acordei aos prantos, o susto grande com o barulho infernal.
Uma nuvem se espalhava em direção ao céu, parecia mais um cogumelo e, que triste, lembrou-me a Rosa de Hiroshima.
Uma beleza agressiva, uma visão infinita.
E a terra ferida clamava sentida: O que foi feito de mim?
Afastei-me, dois passos atrás, não consegui lembrar-me da visão do morro e nem do vale, o barulho ensurdecia e entristecia, e ao longe ouvia a terra ferida gritar algo assim: O que foi feito de mim?


A natureza é o único livro
que oferece um conteúdo valioso
em todas as suas folhas.
Johann Goethe